domingo, 27 de outubro de 2013


FELIZ POR NADA   -  FELIZ POR TUDO
 
Entrada do Teatro das Artes
 
            Se há uma máxima em que acredito muito é a que diz que, “em time que está ganhando, não se mexe”.  E não se deve mexer mesmo. 

Isso pode ser, facilmente, comprovado quando se junta, para trabalhar, o trio formado por MARTHA MEDEIROS, REGIANA ANTONINI e ERNESTO PICOLLO.  “DOIDAS E SANTAS” que o diga, há mais de três anos em cartaz e vista por um público superior a 150 mil pessoas, fazendo, até hoje, uma linda carreira, ininterrupta, por todo o Brasil.

            Agora, o trio se juntou, mais uma vez, para levar ao palco do Teatro das Artes (Shopping da Gávea) “FELIZ POR NADA”, espetáculo que está em cartaz, desde a semana passada (ver serviço, no final).

            Como da vez anterior, REGIANA ANTONINI, escritora, dramaturga e roteirista, transpôs para o TEATRO um livro da consagrada escritora MARTHA MEDEIROS, “FELIZ POR NADA”, que traz uma coletânea de mais de oitenta crônicas.
 
            O espetáculo fala, principalmente da amizade, no caso a de duas mulheres, já maduras, que se cruzam, na corrida diária, ou quase, à volta da Lagoa, e acabam por se tornar as “melhores amigas de infância”. 

Não se trata de uma amizade construída ao longo de uma existência, mas que parece existir há uma longa existência. 

 
É, sim, uma amizade que surge no meio da vida, por acaso, e que passa a ser fundamental para o resto da vida de ambas.  Como as duas chegam a reconhecer, uma não consegue viver sem a outra, sem nenhuma conotação homoafetiva; amor de amigas mesmo. 

Assim pode ser caracterizada a amizade de Juliana e Laura.  Elas se conhecem aos 40 anos, apenas por acenos e rápidos cumprimentos e contidos sorrisos, quando se cruzam durante o exercício físico quase diário, entretanto passam a ser inseparáveis, após um episódio no aeroporto de Tóquio, quando Laura se perde das duas filhas, uma criança e uma adolescente.  Juliana é quem a ajuda a reencontrar as meninas, pelo que a mãe fica eternamente grata.  Nasce, então, uma belíssima amizade, que será posta à prova, por causa de um homem, o Joca, marido de Laura e grande paixão da adolescência de Juliana.

Apesar de o vil ciúme entrar em cena, para atiçar a fogueira da maldade e da desconfiança e tentar abalar aquela sólida amizade, “FELIZ POR NADA” não trata de um triângulo amoroso, e, sim, da relação humana: dos medos, das dúvidas, das inseguranças, das idiossincrasias do ser humano.

O texto trata da mulher, em toda a sua complexidade: seus medos, sonhos, insatisfações, inseguranças, realizações profissionais, o sexto sentido, a atração, a “traição”, a paixão desenfreada e o amor.  E, nessa área, MARTHA MEDEIROS reina absoluta.  Poucos escritores sabem tratar, de forma tão verdadeira, simples e, ao mesmo tempo, profunda, o universo feminino como ela.  Ninguém mais “mulherzinha” que MARTHA. 

É pura identificação – e também estamos falando dos homens - com o dia a dia, com as questões contemporâneas e que falam ao coração.  A plateia se identifica com os dramas e as dúvidas de cada personagem.

A peça recebe a classificação de “uma comédia romântica”, muito bem adaptada por REGIANA ANTONINI e dirigida, excepcionalmente, por ERNESTO PICCOLO, que vem se firmando, cada vez mais, como diretor, além de bom ator que é.  NECO chega a dirigir até três espetáculos ao mesmo tempo, numa demonstração de rara competência e resistência, física e emocional.  Um dos mais requisitados diretores dos últimos tempos, emplacando um sucesso após o outro.  Bem merecidos, diga-se de passagem.  Talento ali não falta, principalmente quando, neste caso, o diretor, por opção ou para não encarecer demais o projeto, resolveu não contar, fisicamente, com um dos mais tradicionais e importantes elementos do TEATRO: o cenário. 
PICOLLO encontra interessantes e objetivas saídas para fazer as cenas acontecerem num palco completamente despido de qualquer elemento cenográfico, embora as cenas se passem em ambientes diversos (interiores, externas, países de culturas totalmente opostas – Brasil e Japão...).

O elenco se comporta de forma brilhante: CRISTIANA OLIVEIRA e LUÍSA THIRÉ são, respectivamente, Laura e Juliana.  Completa ao elenco o ator GIL HERNANDEZ.

CRISTIANA e LUÍSA sabem explorar muito bem as oportunidades que o texto oferece a cada uma para fazer a sua personagem chegar aos espectadores da forma mais íntima e natural possível.  Ambas, muito equilibradamente, apresentam um rendimento de igual qualidade (EXCELENTES!) e conseguem, excepcionalmente, levar a plateia às gargalhadas em cenas hilárias, apoiadas, é óbvio, num texto de qualidade inquestionável. 
Cada uma conta com a generosidade da autora do texto, em seus respectivos “bifes” (falas longas), para demonstrar seu talento na arte de representar.  São duas atrizes que frequentam pouco, relativamente, os palcos cariocas – a primeira por causa de uma atuação mais ativa na TV e a outra por se dedicar, também, a outras áreas dentro do próprio TEATRO -, mas, quando o fazem, deixam sua marca e muita saudade.  Precisam nos dar mais oportunidades de aplaudi-las, como fiz, com explícita vontade e vigor, na última 2ª feira, em sessão reservada a convidados, os quais, certamente, compartilham comigo estas palavras.

Cristiana, Gil e Luísa - excelente química
 
Quanto a GIL HERNANDEZ, apesar de aparecer menos em cena e de representar um personagem, aparente e inicialmente, de menor importância na trama, o Joca, ou João Carlos (este último nome é como é chamado nos momentos em que desperta alguma cobrança ou a ira de uma das duas mulheres, prática comum entre os casais), o ator se comporta muito bem em cena e sabe representar a “escada” (SEM O MENOR SENTIDO PEJORATIVO; MUITO PELO CONTRÁRIO), para que cada uma das duas protagonistas consiga desenvolver a história, a qual, de tão agradável, leve e, até mesmo, despretensiosa, passa, sem que se perceba o ponteiro dos minutos cruzar o mesmo ponto, no mostrador do relógio.  Termina a peça e fica aquela vontade de “quero mais”.  E isso é muito bom. 

Na ficha técnica, estão outros nomes que sempre são garantia de um bom espetáculo:

- A ASSISTÊNCIA DE DIREÇÃO cabe a Bebel Lobo – Ótima, como sempre.

- Os FIGURINOS, variados e de muito bom gosto, são de Helena Araújo.

- A trilha sonora recebe a assinatura de uma das pessoas que mais entendem do assunto: Rodrigo Penna, já algumas vezes premiado e indicado a prêmios, em tantas outras ocasiões, nessa categoria.

- O espetáculo tem a iluminação de um “iluminado”: Aurélio di Simoni.  – Bom trabalho.

- A PREPARAÇÃO CORPORAL é de Kika Freire e a PREPARAÇÃO VOCAL foi feita por Rose Gonçalves.  As duas atrizes, duas belas figuras em cena, uma recém-entrada nos quarenta e outra quase atingindo os cinquenta (ambas não fazem segredo disso) parecem duas mocinhas em cena, demonstrando excelente preparo físico e vocal.  Mérito das duas, ou das quatro.

A DIREÇÃO DE PRODUÇÃO e a REALIZAÇÃO são de duas pessoas que já nos têm oferecido outros ótimos espetáculos: Rogério Fabiano e Valéria Macedo. 

Momento de rara tietagem: acompanhado (bem) de Martha Medeiros e Regiana Antonini
 
 
SERVIÇO: de quinta-feira a sábado, às 19h; domingo, às 18h30.
                     Ingresso: R$ 80,00 (5ª e 6ª) e R$ 90 (sáb e dom).
                     Duração: 70 minutos
                     Temporada até 22 de dezembro

É ótimo sair de uma comédia, leve e feliz.  “FELIZ POR NADA”?  Não: FELIZ POR TUDO. 

Obrigado, gente!

Agradáveis companhias, dentro e fora da plateia: Jorge Leão e Regina Cavalcanti

 
(FOTOS DE DIVULGAÇÃO E/OU FEITAS E CEDIDAS POR REGINA CAVALCANTI)
 

segunda-feira, 21 de outubro de 2013


“PACTO - RELAÇÕES PODEM SER FATAIS”   -  ou  “SÃO DEMAIS OS PERIGOS DESTA VIDA” (Vinícius de Moraes).
 
 Programa da peça

Em cartaz, no Teatro SESI (do Centro – avenida Graça Aranha), de 5ª a sábado, às 19h, a mais recente montagem do diretor IVAN SUGAHARA: “PACTO – RELAÇÕES PODEM SER FATAIS”.  E como!!!

Segundo o programa da peça, “uma história noir”.  E bota “noir” nisso!!!

A peça, baseada num fato real, ocorrido em Chicago, em 1924, foi escrita pelo norte-americano STEPHEN DOLGINOFF e encenada em várias partes do mundo, mas, pela primeira vez, está sendo montada na América Latina.  O próprio autor, também ator, já viveu o papel do psicopata Richard, um dos personagens. 

STEPHEN é um premiado dramaturgo, como atestam os vários prêmios e indicações que recebeu, por esta peça e por outras de sua autoria.  Foram prêmios pelo texto, pelas canções ou pelas letras.
 
Stephen Dolginoff

SINOPSE (adaptação do texto original, de IVAN SUGAHARA, no programa da peça):

Trata-se da história de dois “amigos”, Nathan Leopold e Richard Loeb.  Nathan era capaz de tudo para ficar com Richard.  Essa simples frase define a conflituosa relação dos dois e o quão perigoso pode ser um relacionamento. 

Os dois eram jovens estudantes de Direito, em Chicago, nos anos 20, quando assassinaram um menino, sem um motivo aparente, apenas pelo prazer do crime.  O caso ficou notório e os jovens foram intitulados, pelos jornais da época, como “the thrill killers” (algo como “os assassinos por emoção”). 

Na verdade, o brutal crime não é o que mais interessa na trama.  É, sim, o pano de fundo da peça, servindo para discutir o poder de sedução de um ser sobre outro e até que ponto alguém se submete a tudo por um amor, não correspondido, numa relação doentia e de características de extremo masoquismo, marcada por uma obsessão potencializada ao máximo.

Na trama, Nathan é apaixonado por Richard, que, por sua vez, é apaixonado pelo crime. 

Como forma de garantir a satisfação de ambos, eles fazem um PACTO.  Nathan ajuda Richard na realização de pequenos delitos, em troca de migalhas de sexo e de afeto.  Mas a compulsão deste por crimes cada vez mais excitantes os leva ao assassinato.  É este o preço, além de uma vida na cadeia, que aquele paga para estar com seu louco amor.  Um caso extremo, sem dúvida.  Mas, em qualquer relacionamento, reside a possibilidade de o afeto se transformar em obsessão, no ponto em que a vontade de estar com alguém é confundida com a sensação de que se precisa dessa pessoa para se viver.  Daí o subtítulo “RELAÇÕES PODEM SER FATAIS”, acrescido à montagem carioca.

Por incrível que possa parecer, a peça é um musical.  Não um musical na concepção tradicional deste, com muitos atores, inúmeros cenários, muita luz, brilho, “glamour”...  Nada disso.  É um musical diferente, intimista, com apenas dois atores e um piano, e, ao mesmo tempo, lúgubre e afetivo.  Por isso o gênero “noir” é a sua mais perfeita tradução estética.  “Porque é no escuro que a gente se revela.” (IVAN SUGAHARA).

A idealização do projeto é de GABRIEL SALABERT, que também atua no espetáculo, na pele do pobre Nathan Leopold e que merece ser aplaudido por sua iniciativa.

Gabriel Salabert 

FICHA TÉCNICA – parcial - (acompanhada de alguns comentários críticos):
 
Texto, Música e Letras Originais: STEPHEN DOLGINOFF – Excelentes (destaque para a tradução do texto, feita por GABRIEL SALABERT)

Direção: IVAN SUGAHARA – Ótima, na medida certa.  O texto, por vezes, apresenta cenas e situações que, na mão de um diretor menos experiente, poderiam render momentos de tédio e falta de credibilidade.  SUGAHARA, com seu apurado gosto estético e conhecimento de causa, leva os dois atores a atingir a medida certa de dramaticidade, deixando tais cenas e situações dentro da maior naturalidade possível.

Assistente de Direção: CRISTINA LAGO – afinada com a direção.

Elenco: GABRIEL SALABERT e ANDRÉ LODDI – O primeiro é o apaixonado Nathan Leopold; ANDRÉ vive o frio e brutal Richard Loeb.  A despeito de todo o esforço de GABRIEL, para chegar a um Nathan que não compromete (o ator pareceu-me muito nervoso no dia em que assisti ao espetáculo, ou seja, na estreia, o que é bastante compreensível), sem dúvida alguma, o grande destaque da peça fica por conta de ANDRÉ LODDI.  É muito prazeroso ver o ANDRÉ num palco.  Já o foi em "O DESPERTAR DA PRIMAVERA", "BEATLES NUM CÉU DE DIAMANTES" e em "COMO VENCER NA VIDA SEM FAZER FORÇA".  Trata-se de um jovem recém-entrado na casa dos vinte anos e que tem muito futuro pela frente, em função de seu grande talento para a representação, para o canto e para a dança.  ANDRÉ é aquele tipo de ator que não precisa de texto para aparecer.  O seu silêncio e suas diversas máscaras naturais bastam para sua comunicação com a plateia, principalmente nesta peça.  Que grande “sedutor”!  Sua evolução como artista é facilmente percebida por quem sabe avaliar o rendimento de um ator no palco.

Gabriel Salabert e André Loddi

Pianistas: PRISCILLA AZEVEDO e ANTÔNIO ZIVIANI, alternando-se (este atuou no dia em que assisti ao espetáculo) – Excelente.

Versão Musical Brasileira: MARYA BRAVO – Ótima, não fosse MARYA uma das maiores e mais requisitadas cantrizes dos musicais brasileiros, ela que também já atuou em musicais fora do país e que traz, no sangue, o DNA da música.

Direção Musical e Preparação Vocal: RICARDO GÓES – Muito boa.

Iluminação: PAULO CÉSAR MEDEIROS – Mais um irretocável trabalho deste mestre.  A iluminação perfeita para uma peça “noir”.

Figurino: TARSILA TAKAHASHI – Bom, bem comedido e satisfatório à composição dos personagens.

Cenário: CAROLINA SUGAHARA e IVAN SUGAHARA – Ótimo.  Simples, despojado, caracterizando muito bem os espaços em que se passam as cenas, tudo girando em torno do preto e do cinza.  Afinal de contas, trata-se de uma peça “noir”.

 
André e Gabriel
 
Voltarei a assistir ao espetáculo, não só porque gostei muito da peça, mas também porque sei que ainda há muito a extrair dela e do trabalho dos dois atores, principalmente do GABRIEL SALABERT. 

Acho que também assinei um PACTO com esse espetáculo.  Não com sangue, mas com o coração.
Minha passagem por PACTO
 
 
A conversa primeiro...
 
 ...o abraço depois.
 
 
 
(Fotos de divulgação e de Marisa Sá)

 
 
 
 

 

domingo, 20 de outubro de 2013


FÁBRICA DE CHOCOLATE   -   VERDADE DORIDA, SENTIDA, PARA SER ESQUECIDA.
 
Cartaz da peça

            Um esclarecimento, logo para iniciar: o subtítulo destes escritos sugere que alguma coisa deva ser “esquecida”.  Não é o ótimo espetáculo a que assisti na Sala Rogério Cardoso, da Casa de Cultura Laura Alvim; é a tortura covarde dos milicos sobre suas presas e os assassinatos bárbaros, nos porões da ditadura, durante o negro período referente ao golpe militar que se abateu sobre o Brasil, a partir do fatídico 1º de abril de 1964 (NÃO FOI A 31 DE MARÇO, como dizem os milicos – e os militares também).

            Assim como NEM MESMO TODO O OCEANO, que estará encerrando, amanhã, sua segunda temporada de sucesso no Rio de Janeiro (mas vai voltar ao cartaz), FÁBRICA DE CHOCOLATE é um espetáculo, muito atual, por sinal, em função das manifestações populares de repúdio a tudo o que é errado, podre, corrupto, autoritário no Brasil de hoje, e foi escrito por MÁRIO PRATA e mostra os bastidores das armações da ditadura, que, cada vez mais, estão vindo à tona, mostrando o que, de verdade, aconteceu nos anos 60 e 70 da nossa história, graças à atuação de verdadeiros brasileiros, representantes de entidades como TORTURA NUNCA MAIS e COMISSÃO DA VERDADE.

 
(Da esquerda para a direita:  Victor Garcia, Daniel Villas, Adriana Torres, André Cursino e Henrique Manoel Pinho - o elenco)
 
SINOPSE: “Tudo se passa em clima normal de cotidiano, o que aumenta a carga de crueldade.  Houve, numa sessão de tortura, um “acidente de trabalho”, que é preciso corrigir a todo custo, para não comprometer a imagem do sistema.  O menos inverossímil é transformar a morte em suicídio, depois de uni-lo a um novo assassínio, para que o quadro adquira outras características de veracidade.

Os episódios se sucedem com lógica implacável.  A eficiência se desdobra nas mais variadas medidas, desde a utilização de tipos diferentes de máquinas para o comunicado à imprensa e a redação do laudo médico, até a lembrança de um pormenor anatômico dos suicidas.  As providências se encadeiam, com o objetivo de não deixar aberta nenhuma dúvida suspeita.  Excetuado o erro de se fabricar um "material irrecuperável", tudo o mais se torna perfeito.

PRATA revela uma lucidez surpreendente, em todas as implicações de sua trama.  Do psicológico ao social e ao político, "FÁBRICA DE CHOCOLATE" não deixa desguarnecida nenhuma frente.  Ele evitou pintar monstros patológicos, às voltas com taras incontroláveis.  Se foi lamentável o acidente, inclusive porque impediu o responsável de assistir à partida decisiva de futebol, a máquina repressora é acionada para restabelecer a “ordem”.  Os funcionários exemplares dominam a ciência de oferecer uma versão oficial indiscutível, assegurando até a cumplicidade do industrial, de quem, aliás, se definem como os delegados práticos nas tarefas menos nobres.  Denuncia-se a completa solidariedade dos vários segmentos da população opressora, quando o poder se sustenta pela força e pelo arbítrio.” (www.skoob.com.br)

 Adriana e Henrique (cena tensa)


FICHA TÉCNICA:

Texto: MÁRIO PRATA – Ótimo.

Direção: LUIZAPA FURLANETTO – Correta.

Elenco (por ordem alfabética): ADRIANA TORRES, ANDRÉ CURSINO, DANIEL VILLAS, GUILHERMO REGENOLD, HENRIQUE MANOEL PINHO e VITOR GARCIA. – Todos estão muito bem em seus papéis, com destaque para a composição perfeita de uma lusitana, de ADRIANA TORES, além dos personagens de HENRIQUE MANOEL PINHO (Herrera), ANDRÉ CURSINO (Doutor), DANIEL VILLAS (Baseado) e VICTOR GARCIA (Rosemary).  Não frequentam as mídias, mas são excelentes atores e o demonstram em cena.

Direção de Arte e Cenografia: JOSÉ DIAS – Cenário simples, como simples é toda a montagem, porém muito bom e adaptado ao acanhado espaço cênico da Sala Rogério Cardoso, totalmente oposto ao talento daquele que dá nome à Sala.  Uma sala de uma “delegacia” a serviço da ditadura (não fica claro se foi no Cenimar, na Ilha das Flores; no DOI-CODI, no Quartel do 1º Batalhão da Polícia do Exército, no bairro da Tijuca, na Rua Barão de Mesquita nº 425; na Casa da Morte, em Petrópolis...).  O destaque é para as prateleiras e um aramado ao fundo, onde estão expostos, “arrumadinhos”, objetos utilizados na tortura, desde os mais simples aos mais insólitos.

Assistente de Cenografia: ALINE BOECHAT

 Figurino: JOÃO DE FREITAS HENRIQUES – satisfatório, dentro das características da época.

 Trilha Sonora: MÁRIO PORTELLA – Boa.

 Idealização e realização: HERMES FREDERICO – Muito oportuna e merece aplausos.

Os poderes civil e militar tramam para o restabelecimento da "ordem"
 
            Eu conhecia o texto apenas de leitura, o que já me causava bastante sofrimento e desconforto.  MÁRIO PRATA domina a carpintaria dos diálogos, muito mais do que a arte de criar uma história, observação feita com relação às suas várias novelas, de grande sucesso, já exibidas na TV.  Mas, para o TEATRO, MÁRIO capricha mais.  Seus textos teatrais são excelentes e este é uma prova disso.

Até o dia 3 de novembro, de 5ª a sábado, às 21h, e domingo, às 20h.

Recomendo muito este espetáculo, mas sugiro que o espectador não jante, nem antes nem depois.  O resultado poderá ser desastroso.

quarta-feira, 16 de outubro de 2013


ENTRE ATOS  (1)

 

 
Por total falta de tempo, deixei de recomendar uma CESTINHA BÁSICA DE TEATRO INFANTIL, para a SEMANA DA CRIANÇA. 
Mas, como todo dia é DIA DE CRIANÇA, ficam aqui algumas dicas:
 
BRANCA DE NEVE, de Leandro Mariz. Com Ana Claudia Padilha, Francine Flach, Myriam Pimentel, entre outros. Dir. Sabrina Korgut. Teatro Imperator. Sáb e dom, 16h. R$30. Livre. Até 27/10.
 
A COZINHEIRA, O BEBÊ E A DONA DO RESTAURANTE.  Com Isadora Medella, Tania Gollnick e Ademir de Souza. Dir. Luis Igreja. Sesc Madureira. Dia 27/10, 16h. R$8. Livre
 
O JARDIM SECRETO, de Renata Mizrahi (adaptação).  Com Camilla Amado, Elisa Pinheiro, Arlindo Lopes, entre outros.  Dir. Rafaela Amado e Camila Schwartz. C.C. Banco do Brasil. Sáb e dom, 16h. R$10. Livre. Até 13/10.  ATENÇÃO: APESAR DE A TEMPORADA, NO C C B B, TER TERMINADO NO DIA 13/10, VALE A PENA FICAR ATENTO, POIS O ESPETÁCULO IRÁ PARA OUTRO TEATRO.
 
A MENINA EDITH E A VELHA SENTADA, adaptação de Elísio Lopes Junior e Lázaro Ramos.  A história de uma criança que acredita ter uma velha sentada na cabeça e vai em busca da mesma, fazendo uma viagem pelos cinco sentidos.  Com Rose Lima, George Sauma, Késia Estácio, entre outros.  Dir. Lázaro Ramos. Teatro dos Quatro. Sáb e dom, 17h. R$50. Livre.
 
PLUFT, O FANTASMINHA, de Maria Clara Machado.  Com Claudia Abreu, Maria Clara Gueiros, José Lavigne, entre outros.  Dir. Cacá Mourthé. Teatro O Tablado.  Sáb e dom, 17h. R$50. Livre.
 
SASSARIQUINHO, concepção Sérgio Cabral e Rosa Maria Araújo.  Com Pedro Paulo Malta, Juliana Diniz, Beatriz Faria, Pedro Miranda, entre outros. Dir. Claudio Botelho e Charles Möeller.  Teatro das Artes.  Sáb e dom, 17h. R$60. Livre.
 
NADISTAS E TUDISTAS, de Doc Comparato, adaptação livre de Renata Mizrahi.  Direção de Daniel Herz.  Com Lorena Comparato, Clarissa Kahane, Rodrigo Fagundes, Wendell Bendelack, Gabriela Rosas, Lucas Drummond e Tatiana Infante.  De 24/08/2013 até 20/10/2013 - Oi Futuro Flamengo
 

 

LABORATORIAL : Espaço SESC – Mezanino: 6ª e sáb, às 19h; dom, às 17h
Dirigido por César Augusto e Simon Will, interpretado por MARCELO VALLE.
Misturando ficção e realidade, o ator (excelente, por sinal), faz uma reflexão sobre a sua vida.
Além da ótima interpretação de MARCELO e da direção a quatro mãos, um outro grande destaque do espetáculo é utilização de várias mídias, muito bem exploradas e, melhor ainda, postas em prática.
Um belo espetáculo, que merece ser visto.  Uma grande aula de interpretação.  Teatro inteligente.

 
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Marcelo Valle
  

            A OUTRA CIDADE : C C B B – Teatro I: de 5ª a dom, às 19h30min.
            Excelente espetáculo! 
Texto e direção de PEDRO BRÍCIO, um dos mais talentosos dramaturgos da nova geração.
Elenco: BERNARDO MARINHO, BRANCA MESSINA, CELSO ANDRÉ, ERICA MIGON, LUDMILA ROSA, SÁVIO MOLL e SÉRGIO MÓDENA.
Direção de Arte: Rui Cortez
Iluminação: Tomás Ribas
Música: Felipe Storino
Programação Visual: Alcino Giandinoto
Projeções: Lucas Canavarro
Preparação Corporal: Cristina Moura
Supervisão Vocal: Letícia Carvalho
 
O texto, por vezes hermético, é verdade, fala da “possibilidade de uma pequena cidade litorânea ser destruída pelo mar.  Isso provoca as mais estranhas e diversas reações dos personagens.  Conflitos familiares e questões individuais vêm à tona em uma sociedade que convive com a sensação de uma catástrofe iminente.” (extraído do programa da peça)
 
Todos os atores fazem um excelente trabalho, com destaque para BERNARDO MARINHO, que interpreta um menino (depois, adulto), Valentin, e para CELSO ANDRÉ, que se divide em cinco personagens: Militar, Carteiro, Prefeito, Onetto e Delegado.  É brilhante sua interpretação para o cego Onetto.
 
Um espetáculo que merece ser visto.

 

 

 

 

domingo, 13 de outubro de 2013


LIMITES GEOGRÁFICOS E ÉTICOS NO TEATRO

ou

CADA MACACO NO SEU GALHO
 
 
 
 
            Ninguém mais do que eu tem paciência de suportar, até o final, um espetáculo de teatro, por pior eu ele seja, quer em qualidade, quer por outro motivo.  Vontade de fazê-lo não me faltou muitas vezes, mas resisto bravamente, até o acender das luzes da plateia, na esperança de que “vai melhorar”.  Para quem tem 64 anos de idade e, há muitos anos, muitos mesmo, frequenta as salas de espetáculo quase que diariamente, considero isso um grande feito e uma incomensurável prova de tolerância e resistência emocional.

            No correr de décadas como espectador, só me lembro de, por três vezes, ter abandonado uma “peça” antes do fechar das cortinas, sendo que as duas mais recentes ocorreram num curtíssimo espaço de duas semanas, e isso está me assustando. 

A última ocorreu ontem.  As duas, entretanto, por motivos diferentes.
 
 


A primeira, no dia 29 de setembro, porque, para ser péssima, precisaria melhorar muito – texto, atuação do elenco, direção, cenários, figurinos...  Tudo parecia teatrinho (nada mais pejorativo do que o diminutivo de TEATRO) de paróquia de subúrbio de Tribobó da Borborema (o nome é fictício e, se existe alguma localidade com essa denominação e/ou se este texto chegar a algum munícipe de lá, ou que lá tenha nascido, já me penitencio, antecipadamente, na iminência de um processo).  

A de ontem, além de não ser nenhuma “brastemp”, tem uma (até onde suportei; não sei se houve outras) cena de plateia, totalmente desnecessária e de mau gosto, da pior qualidade, que, por si, já era suficiente para que os espectadores passassem ao largo do teatro, caso soubessem, previamente, de sua existência.
 
 


Sou radicalmente contrário – NÃO ADMITO MESMO – a cenas desse tipo, porque entendo que ninguém sai de sua casa, enfrenta uma série de dificuldades para ir a um teatro, paga caro por um ingresso (hoje, por compromisso profissional, não é o meu caso), para ser tomado como otário por um, quase sempre, arremedo de ator/atriz, o(a) qual, por falta de talento próprio e/ou por orientação de um diretor menor, para provocar o humor, apoiado num bom texto, tem de descer à plateia, com a finalidade de fazer perguntas a espectadores, muitas vezes, como a de ontem, constrangedoras e ofensivas.  

Quem não se importar com isso, ótimo!  Continue a trabalhar de graça e a ser humilhado, para que o “artista” receba o seu salário à custa da sua humilhação e do seu constrangimento.

Sou ator, embora há muitos anos fora dos palcos, mas jamais aceitaria fazer esse papel ridículo. 

Não que eu não ache que possa haver alguma interação entre o ator, no palco, e a o público, na plateia.  Mas não diretamente, ofensivamente, e sem propósito algum relacionado ao texto. 
 
 


Já vi inúmeros espetáculos em que essa atitude, a de interagir com a plateia, só faz aproximar mais ainda artista e público e, ao contrário do que ocorreu ontem, e despertar maior interesse e simpatia deste por aquele(a).  Posso citar um dos mais recentes: CALANGO DEU – OS CAUSOS DE DONA ZANINHA, texto da melhor qualidade, dirigido por um diretor de verdade e interpretado por uma diva dos palcos, infelizmente ainda não conhecida do grande público, por não estar nas novelas da TV GLOBO.  Trata-se de SUZANA NASCIMENTO, que interpreta a Dona Zaninha (texto dela, autobiográfico), oriunda do interior de Minas e que, “abre sua cozinha para o público e oferece um delicioso cafezinho, feito por ela mesma, à vista de todos, logo no início do espetáculo.  E conversa com a plateia durante quase toda a peça.  Não há como não se apaixonar pelo conjunto da obra.  Já assisti a este grande espetáculo, que recomendo (Teatro Poeirinha, às 3ªs e 4ªs, às 21h) três vezes e ainda vou tomar mais cafezinho com aquela ARTISTA, com todas as maiúsculas.
 
 
Aceita um cafezinho?  (Suzana Nascimento) 
 
 
Suzana Nascimento - CALANGO DEU - OS CAUSOS DE DONA ZANINHA
 
Meu amigo GABRIEL LOUCHARD, está, há mais de dois anos, em cartaz, com um espetáculo que reúne “stand-up” e mágicas, durante o qual ele convida pessoas da plateia a “ajudar nas mágicas”.  Tudo sem a menor intenção de ofender ninguém e, durante todo esse tempo de total sucesso de público e de crítica, ninguém se arrependeu de ter subido ao palco.  Gabriel, como grande ator e dono de uma sensibilidade e de uma inteligência invejáveis, consegue perceber quando há resistência por parte do convidado e não insiste no convite, partindo, imediatamente, para outra pessoa.  O respeito ao público é total, no espetáculo COMO É QUE PODE?, que também recomendo, às 6ªs e sábados, às 23h, no Teatro das Artes.

O que está em jogo aqui são dois limites: o geográfico, do espaço destinado à encenação, e o ético, cuja carência, infortunadamente, atinge um certo número de atores/atrizes.

Geograficamente falando, dois são os espaços definidos numa sala de espetáculo: palco e auditório (plateia).  O primeiro é destinado à encenação, à ação dos atores; o segundo é o que deve ser ocupado pelo público, pelas pessoas, para que assistam à encenação dos actantes, e não para fazer parte dela. 
 
 
Gabriel Louchard e uma convidada (ajudante de mágico) em COMO É QUE PODE?
 
Quando uma pessoa da plateia é convidada a “entrar em cena”, é convidada mesmo; ninguém deve obrigá-la a participar da cena, como ocorre, por exemplo, nos espetáculos de ZÉ CELSO MARTINEZ CORRÊA, ou do AMIR HADDAD, ou de tantos outros encenadores.  A pessoa vira actante porque assim o deseja.  Eu mesmo, aliás, quase sempre que isso ocorreu, “entrei na dança” e me diverti muito.  Adoro esse tipo de espetáculo!  Isso, no meu DICIONÁRIO, se chama “interação” e não há outra intenção a não ser esta.  Ninguém constrange ninguém com perguntas sobre sua intimidade, para provocar risos de outras pessoas, as quais, se colocadas no lugar da vítima, não achariam a menor graça.
 
 
Zé Celso Martinez Corrêa e um dos seus espetáculos (participação espontânea da plateia)
 
 
Amir Haddad e o grupo TÁ NA RUA (participação popular, por vontade própria)
 
Também o ator que acha certo descer à plateia para humilhar e constranger outrem deveria ter o mínimo de “simancol”, além de sensibilidade, respeito ao próximo, amor à profissão e dignidade profissional, para perceber se o(a) escolhido(a) está gostando ou não de ser alvo daquela palhaçada e, imediatamente, improvisar uma saída honrosa, para não ficar com cara de “vem-cá-meu-bem”.  Mas, para isso, é necessário que seja um ATOR, e não um “ator de um personagem só”, como é o caso do de ontem, que até tem um grande público seguidor (o teatro estava esgotado), o que não chega a ser nenhuma novidade, pois um dos piores programas de “humor” da TV brasileira,a meu juízo, está no ar há trocentos anos, para orgulho do seu diretor e alegria dos donos da emissora (fatura muito), porém, em termos de qualidade, só perde para si mesmo.

O texto da peça é interessante, o que corrobora a minha opinião de que não seria necessário apelar para cenas de plateia, e os outros atores têm um rendimento razoável, aceitável.  Gosto do texto e da versão para o cinema. 

E o pior é que, depois da tal cena, o nome da vítima, volta e meia, é citado, em cenas subsequentes, em outras piadinhas de péssimo gosto, o que, novamente, provoca gargalhadas homéricas dos outros da plateia e olhares convergentes para o indivíduo, o cidadão, o ser humano, exposto ao ridículo, até que a paciência da pessoa chega ao seu limite e, ou ela se levanta e diz uma meia dúzia de palavrões ao agressor, indo embora em seguida, arrependida de não lhe ter dado um soco na cara (felizmente, isso não é do meu feitio; mas torço para que alguém o faça um dia) ou sai de campo, que foi a minha opção, aproveitando-me de um ligeiro “black-out”, com menos de trinta minutos de um “espetáculo” com duração prevista para oitenta.

Quanto aos limites éticos, parece-me que, para algumas pessoas, isso seja de muito mais difícil percepção, porque não conhecem a palavra “ÉTICA” ou, por alto, já ouviram falar dela.  Faltam-lhes, também, no seu “DICIONÁRIO”, talvez por ser “PEQUENO” e só voltado ao campo “AMOROSO”, os verbetes “RESPEITO”, “SOLIDARIEDADE”, “TALENTO”, “PERSPICÁCIA”... (este, então, deve soar como um palavrão, para esse tipo de pessoa), se bem que, em matéria de amor, todos devem ser conhecidos e praticados.

Se você não está disposto a passar o que passei ontem, pergunte, antes de entrar no tetro, ou melhor, antes de comprar o seu ingresso, se a peça contém esse tipo de baixaria.  Se for dos meus, procure o teatro ao lado.  Sempre há um; às vezes, ao lado mesmo.  Quem sabe, até mais de um.  E com espetáculos dignos de serem vistos e prestigiados, porque não contêm apelação e respeitam o público.

A propósito, deveria estar afixada, na bilheteria, para esse tipo de “espetáculo”, de forma bem legível, uma placa com os dizeres: ESTA PEÇA CONTÉM CENAS DE PLATEIA, DE PÉSSIMO GOSTO E QUE SERVEM PARA DIVERTIR ALGUNS, À CUSTA DO CONSTRANGIMENTO E DA HUMILHAÇÃO DE OUTROS.  

Deveria ser uma obrigação, como há aquelas que indicam a proibição de consumir alimentos na plateia, ou de não fotografar e filmar o espetáculo, ou de desligar aparelhos sonoros...  Garanto que a ocupação das poltronas não seria como a de ontem.

É certo que o ator não tem a obrigação de saber se aquela é a pessoa indicada para servir às suas “brincadeirinhas sem graça”, porque ninguém traz uma placa, com tal indicação, pendurada no pescoço, como também é verdade que ninguém é obrigado a adivinhar que passará vexames, quando apenas desejava assistir a um bom espetáculo.  

DEVE SER PELA FALTA DA SEGUNDA QUE DEVERIA EXISTIR A PRIMEIRA, uma vez que não é em qualquer teatro que se encontra uma Suzana Nascimento, um Gabriel Louchard e outros ARTISTAS, na mais ampla acepção da palavra.
 
Para representar a TRAGÉDIA, bastaria a máscara da direita, em posição inferior, sem a lágrima.  Mas esta é a imagem mais próxima de quem saiu, ontem, daquilo que se propunha a ser uma comédia
 
Que pena!