sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014


O DUELO

 

(UMA VISITA MUITO BEM-VINDA.)




Quem vai ao Teatro Tom Jobim, dentro do Jardim Botânico, para assistir a um espetáculo teatral recém-estreado, O DUELO, que traz, na ficha técnica, o nome de ANTON TCHEKHOV, como autor do texto, esperando encontrar, ali, as temáticas mais frequentes na obra do consagrado escritor russo ou ver encenações de um texto especificamente escrito para o TEATRO, como é o caso de A GAIVOTA, O JARDIM DAS CEREJEIRAS, O URSO, AS TRÊS IRMÃS ou TIO VÂNIA, por exemplo, há de sair um pouco frustrado de lá.  Por vezes, o espetáculo até não parece ser um TCHEKHOV. 


Isso porque o espectador em questão não sabe (ou se esqueceu de) que, além de grande dramaturgo, TCHEKHOV também se destacou em ensaios, novelas e contos.  Também não se deu conta de que O DUELO, que se verá no palco, é a adaptação de uma novela, feita por VADIM NKITIN e AURY PORTO (com a colaboração de CAMILA PITANGA), a partir da tradução de KLARA GURIÁNOVA.


E ainda há um outro grande detalhe: o espetáculo é apresentado pela MUNDANA CIA., um grupo bastante ousado, à frente de seu tempo, que tem projetos desafiadores, como foi o caso de O IDIOTA, uma das produções mais recentes da companhia e que fez duas temporadas no Rio de Janeiro e viajou por todo o Brasil.  Espetáculo brilhante, inesquecível, ao qual assisti três vezes, na versão completa, num só dia, com quase oito horas de duração.  O trabalho do grupo anterior a este O DUELO foi PAIS E FILHOS, de TURGUENIEV, com direção de ADOLF SHAPIRO.










Confesso que a expectativa em mim estabelecida, desde que soube dos primeiros passos para a produção de O DUELO, tudo motivado pelo impacto que me causou O IDIOTA, não chegou a ser atingida, entretanto, não me arrependo nem um pouco de ter ido à estreia deste novo espetáculo, no dia 6 de fevereiro (a temporada vai até 30 de março).


Não conheço a novela, motivo pelo qual não me cabe avaliar o trabalho de adaptação para o palco, porém, agradou-me o que vi.  Acho que uma história foi bem contada, de forma clara e agradável e, principalmente, muito bem representada por brilhantes atores, com destaque especial para AURY PORTO (IVAN LAIÉVSKI), idealizador do projeto, CAMILA PITANGA (NADIEDJA FIÓDOROVNA), CAROL BADRA (MÁRIA BITIUGOVA), FREDY ÁLLAN (DIÁCONO POBÊDOV), PASCOAL DA CONCEIÇÃO (NIKOLAI VON KOREN), SÉRGIO SIVIERO (FANTASMA DE DÍMOV / KIRÍLIN) e VANDERLEY BERNARDINO (ALEKSANDR SAMÓILENKO).


O DUELO, no seu original, é uma novela narrada a partir do ponto de vista de diversas personagens, reunidas no mesmo objetivo: esquecer os dias que perderam e aproveitar, da melhor forma possível, os que ainda têm para viver.  TCHEKHOV  coloca em confronto, numa pequena cidade do Cáucaso, um funcionário público e a sua jovem mulher, um médico militar, um zoólogo de ideias radicais e um diácono dado ao riso. A história é contada através dos olhos de cada protagonista, conseguindo o leitor entender que qualquer um deles, independentemente da sua relação com os outros, procura apenas uma forma de escapar ao rotineiro dia a dia.  É nesse ambiente que o ódio crescente entre o zoólogo e o funcionário culmina num duelo e este, numa espécie de redenção. E, quando o zoólogo deixa a cidade, as oscilações do seu barco são transformadas por TCHEKHOV numa metáfora da vida.












O personagem de AURY é um homem em crise, de origem aristocrática, que deixou a cosmopolita São Petersburgo para viver no distante Cáucaso, com sua mulher, a personagem de CAMILA, que, por sua vez, ousou abandonar o marido para se lançar na aventura.  Ocorre que, dois anos depois, quando, na verdade, tem início a narrativa, ambos se sentem entediados e solitários.



Cada cena do espetáculo está repleta de pequenos duelos, alguns com desdobramentos terríveis, muitos originados da oposição entre o comportamento do casal e os hábitos conservadores da distante província.






Como já foi dito, a ação se passa numa cidadezinha banhada pelo mar Negro, numa região montanhosa e quase desértica, quase inóspita, no Cáucaso, sob um verão senegalês.  Esses ingredientes levaram a companhia a se deslocar para o sertão cearense, onde foram iniciados e realizados todos os ensaios, até que o projeto fosse considerado pronto para estrear.  Tudo para que o elenco pudesse mergulhar melhor na "geografia da narrativa". 


Um pequeno parêntese, que incomodou bastante a todos quantos tiveram o prazer e o privilégio de assistir à estreia da peça: não sei se, de propósito ou por outro qualquer outro motivo, foi desligado o sistema de refrigeração do teatro, durante toda a encenação, de cerca de três horas e meia – mais ainda, se for computado o tempo de intervalo entre os dois atos.  Isso causou grande mal-estar e desconforto ao público, que teve de suportar um calor quase insuportável.




GEORGETTE FADEL, que assina a direção do espetáculo, cumpre, corretamente, a sua função.  Em O DUELO, há belos momentos em que elementos de cena, como um enorme balão de plástico, dentre outros, contribuem para a comunicação com os espectadores, por meio de interessantes metáforas.


A direção de arte / cenografia, de LAURA VINCI, merece destaque.


É boa a iluminação de GUILHERME BONFANTI, assim como agradam os figurinos, de DIOGO COSTA.





O ponto alto deste espetáculo está na interpretação, no trabalho dos atores.  Enfatizo: de excelente qualidade.


Recomendo uma ida ao Teatro Tom Jobim, para que possa ser conferida mais uma bela proposta cênica da MUNDANA CIA..


Valeu, AURY e FREDY!



Valeu, CAMILA!  O trabalho do ator/atriz só é bom no cinema e na TV, quando o é no palco.  Você é uma grande atriz.


Valeu, MUNDANA CIA.!



Que venham outros autores russos, adaptados ou não, brasileiros, americanos, italianos...  Mas que vocês nos tragam, sempre, mais TEATRO. 
           
           O Rio de Janeiro agradece e merece ter vocês entre nós.

           Que visita bem-vinda!









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EU e AURY PORTO







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EU e FREDY ÁLLAN





(FOTOS DA PRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO DA PEÇA E DE MARISA SÁ.)



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