domingo, 2 de novembro de 2014


VOU DEIXAR O AMOR PRA OUTRA VIDA

 

 


 

(E NESTA...)

 

 

 

 

           

 

 

 

            Mais outra resenha sobre um espetáculo de TEATRO, que não é feito num teatro. É TEATRO, porém é como se não o fosse.  Esta é a proposta da Cia Coletivo Capricórnio: dar a impressão de que não há um texto e fazer com que tudo se aproxime, ao máximo, de uma realidade extrema.  Isso é uma prova de que uma atividade teatral pode prescindir do espaço tradicional de um palco, coxias, camarins, tudo separado de uma plateia, com poltronas, numeradas ou não, e outros detalhes.  TEATRO se faz até na rua (VIVA AMIR HADAD e seu GRUPO TÁ NA RUA! – nos bons momentos).

           

Na semana passada (28/10/2014), estreou sua terceira temporada, no Rio de Janeiro, o espetáculo VOU DEIXAR O AMOR PRA OUTRA VIDA, de RODRIGO MONTEIRO, com direção de JORGE FARJALLA, cuja ação se passa na sala de um apartamento, no caso o de um dos atores do espetáculo, MATHEUS SILVESTRE, em Copacabana.

 

            Não bastasse o inusitado de um espetáculo teatral ser apresentado dentro de uma residência, acrescente-se a esse diferencial outro tão interessante quanto: um jantar é servido, ao longo da encenação (capeletti aos quatro queijos, com molho – afrodisíaco -  de rosas, merengue de morango de sobremesa, com direito a café, tudo regado a muito vinho, água e refrigerantes).  O chefe é o próprio diretor da peça.

 

 

Vou Deixar o Amor para Outra Vida

Um brinde ao amor?

 

 

 


Matheus Silvestre, Diogo Pasquim, Ivan Vellame, Carol Loback e Diego Araújo.

 

               

Pode-se dizer dela que é uma peça interativa, porém não participativa, em que a arte se integra à vida do dono do apartamento, sem separação entre atores e espectadores.  Os quatro artistas circulam, normalmente, pelo espaço e pelos convidados, como se houvesse duas realidades simultâneas, a dos espectadores e a dos personagens.  E é muito possível cada espectador também se sentir personagem (falo por mim), contudo ninguém da “plateia” é obrigado a participar das cenas, muito menos não se passa por situações de constrangimento e humilhação, como, infelizmente, ocorre em muitos espetáculos desse gênero (interativo).  Ao contrário, os atores se dirigem a um ou outro espectador, sem exigir sua participação, deixando-o bem à vontade para interagir ou não.  Um dos atores chegou a me pedir para se sentar no braço de poltrona que eu ocupava e ali ficou por alguns minutos, falando diretamente para mim, cara a cara.

 

            Na verdade, a peça já começa na calçada, em frente à portaria do prédio, onde as pessoas são recebidas por uma “hostess” (o tom sofisticado foi dado por mim), que confirma cada nome na lista e faz o convite para que subam até o apartamento.  São os próprios atores que recebem o público, em trajes de “andar em casa” (robe, bermuda e sem camisa, descalços...) e vão se arrumando, vestindo os figurinos da peça, ali mesmo, à frente de todos, enquanto batem papo com os “convidados”.  As pessoas vão se acomodando, ficando à vontade, bebendo com os atores, conhecendo-se, uns aos outros, criando uma atmosfera propícia ao desenrolar da ação.  

 

 

 

 
SINOPSE (fornecida pela Produção), com adaptações:
 
Quatro amigos se encontram para jantar, em um apartamento em Copacabana, como nos velhos tempos.
 
O público é convidado a jantar com esses quatro amigos, dispostos a se libertarem da tarefa de amar e, talvez assim, amar mais, mais livremente e melhor.  Amar não é uma obrigação e exige predisposição e consciência dos riscos que se corre e do preço que se paga para vivê-lo.  
 
Criado pela CIA COLETIVO CAPRICÓRNIO, com texto de RODRIGO MONTEIRO e direção de JORGE FARJALLA, o espetáculo é teatro, mas se esforça em parecer que não é.  O feito dá um efeito de “hiper-realidade”.  Fumar será permitido, atender o celular e trocar mensagens não será proibido; beber e comer serão um convite.
 
 

 

 

 

 


Viva (ou não viva?) o amor!

 

 

 

(Foto: Divulgação / Philipp Lavra)

Amor erótico.

 

 

 

Como se pode observar, a sinopse da peça é muito simples, mas não simplista, uma vez que os quatro amigos discutem, dividindo com o pequeno público, as mazelas do amor, muito menos o seu lado bom, positivo, e muito mais o que provoca o sofrimento, quando se vive uma relação amorosa.  “Falamos de relacionamentos. Quando alguém leva um pé na bunda, normalmente se reúne com os amigos para beber.”, é o que diz JORGE FARJALLA.  E eu acrescento: e para conversar, chorar as dores, fazer acusações, tentar isentar-se das culpas, procurar o famoso “ombro amigo”. 

 

 

 

 


Um outro ângulo do amor.

 

 

 

Assim, aspectos como (in)fidelidade, traição, respeito mútuo, (in)tolerância são tratados de forma rasgada, com todas as letras e tons, sem qualquer escrúpulo, sem nenhum pudor e sem a menor preocupação em poupar alguém, quando cada um dos quatro, na verdade, só deseja se esquivar das saraivadas e poupar o próprio peito, tentar sofrer menos.  Tudo isso decorre sem nenhuma sequência cronológica, entretanto toda a dramaturgia é lógica e reúne, costurados, pequenos diálogos, muito ágeis, simples e naturais, por meio dos quais os assuntos são discutidos.  Começa com uma discussão entre os três personagens masculinos, envolvidos num relacionamento não a três, mas entre os três; ou seja, alguém trai alguém; alguém é traído por alguém; todos se traem, na verdade.

 

 

 


Reflexões.

 

 

 

A peça é dividida em duas partes.  Na primeira, a personagem feminina atua como uma espécie de narradora da trama, a ligar os diálogos e as sequências de cenas.  Na segunda, ela também se envolve, ou se vê envolvida, nos relacionamentos.

 

Na primeira parte, à exceção de CAROL, personagem de CAROL LOBACK, os nomes dos três personagens masculinos não são revelados.  São identificados, apenas, como FILÓSOFO (MATHEUS SILVESTRE), ECONOMISTA (IVAN VELLAME / DIOGO PASQUIM – os dois se revezam no papel) e DIPLOMATA (DIEGO ARAÚJO).

 

Na segunda parte, CAROL LOBACK é a JORNALISTA; DIEGO ARAÚJO é o PROFESSOR; MATHEUS SILVESTRE é o CANTOR; e IVAN VELLAME e DIOGO PASQUIM se revezam como o GUITARRISTA.

 

 

 

             

Posso ajudar?

 

 

            Essa anonimidade e a proximidade física do espectador com o ator permitem que cada pessoa vá se vendo - ou não - em cada um – ou em mais de um - dos personagens.  Por mais de uma vez, flagrei-me sacudindo, levemente, a cabeça, meneando-a, para cima e para baixo, concordando com algumas das reflexões que eram desfiladas sobre o amor e suas implicações.  “Isso aconteceu comigo”, eu pensava.  É muito fácil se projetar nos personagens, interpretados de forma tão natural e espontânea pelos quatro atores, completamente nivelados no trabalho.  Nivelados positivamente.  Gostei, por igual, da atuação de todos.

 

            Dirigir um espetáculo desse tipo exige que o diretor se liberte dos seus “poderes” e permita que os atores exercitem uma liberdade de criação, para que o desejado nível de naturalidade, do “não parecer TEATRO” aconteça de verdade, denotativa e conotativamente falando.  Assim trabalhou, e bem, FARJALLA.  Percebe-se que há marcações, indicações de como se dizer algo, de como reagir diante de algo, mas o que passa é que seu bom trabalho liberou os atores para algumas improvisações e “cacos” bem pertinentes, inerentes à proposta.  Bom trabalho.

 

            O texto de, RODRIGO MONTEIRO, não apresenta nada de surpreendente.  E nem precisava apresentar.  É enxuto, na medida certa, diz apenas o que tem de ser dito, sem gorduras, sem volteios.  Vai direto, com o indicador, na ferida.  E o resultado é muito bom.

 

 

 


Por que eu tinha de ficar fora disso?

 

 

 

 

 
FICHA TÉCNICA:
 
Texto: Rodrigo Monteiro
 
Direção e Encenação: Jorge Farjalla
 
Elenco: Carolina Loback, Diego Araújo, Ivan Vellame (Diogo Pasquim, às vezes, substitui Ivan) e Matheus Silvestre.
 
Cia Coletivo Capricórnio
 
Produção: Talitha Caetano e Diogo Pasquim.
 
(Os demais detalhes da FICHA TÉCNICA, como cenário, figurino, iluminação... não foram fornecidos.)
 
 

 

 

 

 
SERVIÇO:
 
Local: Apartamento em Copacabana (O endereço é revelado, pela Produção, após a compra do ingresso.)
 
Temporada: Até 17 de dezembro
 
Dias: 3ªs e 4ªs feiras
 
Horário: 20h
 
Gênero: comédia romântica
 
Preço: R$ 40,00 (valor único que já inclui ingresso e jantar)
 
Reservas: coletivocapricornio@gmail.com e mais informações (21) 98899-6061

Duração: 1h
 
Classificação: 18 anos
 
 

 

 

            Recomendo o espetáculo, na certeza de que o especatdaor sairá daquele apartamento, refletindo e repensando seus conceitos sobre o amor e como, e até onde, se deve correr atrás dele e tentar preservá-lo.  No mínimo, sairá pensando se não é melhor adiá-lo par uma outra vida.  Foi assim que bateu em mim.  Para quem acha que tudo acaba com a morte, certamente, se estiver sozinho, no momento, terminada a peça, sairá pelo bairro de Copacabana, desesperadamente, à procura de alguém que possa chamar de seu.

 

            No mais, vamos a TEATRO ou a um apartamento, para ver TEATRO!

 

 

 

 

(FOTOS: PHILIPP LAVRA)

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